Na sessão cultural de 19 de setembro da Academia de Marinha foi apresentada a comunicação “Batalha Naval do Cabo Matapão (julho 1717)”, pelo Prof. Doutor Nuno Gonçalo Freitas Monteiro e inaugurada, na Galeria, a Exposição intitulada “Batalha Naval do Cabo Matapão. Participação da Marinha Portuguesa em 19 de julho de 1717”.
Para o orador a participação portuguesa na Batalha Naval do Cabo Matapão concentra-se em três temas que, de forma muito clara, se cruzam nas orientações da política europeia da dinastia de Bragança depois da participação na Guerra da Sucessão de Espanha, nos equilíbrios internos e os lugares de decisão política da monarquia e por fim nos recursos e nos legados institucionais da Marinha Portuguesa naquele contexto.
De salientar que as relações entre Portugal e a Santa Sé no tempo de D. João V e do Papa Clemente XI enquadram-se no contexto do conflito otomano no Mediterrâneo, que levou à batalha naval de Matapão. Assim, o Papa, na tentativa de neutralizar a crescente ameaça de expansão do Império Otomano, pediu auxílio aos principais reinos cristãos da Europa. Portugal, por razões estratégicas de afirmação no panorama internacional, participou com uma esquadra comandada por Lopo Furtado de Mendonça, Conde do Rio Grande.
Esta força naval saiu no dia 15 de julho de 1716 rumo ao Mediterrâneo. Atrasada por ventos contrários e por uma escala no porto de Livorno, quando chegou a Corfu, para receber instruções, já os turcos se tinham retirado. Tal facto deveu-se, possivelmente, à derrota sofrida na frente do Danúbio perante os exércitos imperiais da Áustria, e ao conhecimento da aproximação da armada cristã. Em novembro a armada chegou a Lisboa, sem ter entrado no conflito, mas como “singular prova de gratidão”, o Pontífice dividiu a diocese de Lisboa em oriental e ocidental, atribuindo ao arcebispo de Lisboa ocidental “o nome, título e prerrogativa de igreja patriarcal”, criando, pela bula In supremo apostulatos solio, de 7 de novembro de 1716, o Patriarcado de Lisboa.
Continuando as ameaças sobre as possessões de Veneza, em dezembro de 1716 voltava o Papa a escrever ao monarca português, renovando o pedido de auxílio e respondendo D. João V afirmativamente.
De novo, sob as ordens do Conde do Rio Grande, a esquadra de 1717, agora com 11 navios (sete naus, dois brulotes, um transporte e uma tartana), artilhados com 448 peças de artilharia saiu de Lisboa a 25 de abril de 1717 com destino a Corfu, onde se reúne com as armadas de Veneza, Florença, Malta, França e dos Estados Pontifícios, constituindo assim um conjunto capaz de se opor aos turcos. O confronto e sucesso da esquadra cristã na batalha de Matapão, travada a 19 de julho de 1717, são conhecidos no Diário, escrito pelo capitão da nau Nossa Senhora das Necessidades, e ainda por diversas outras memórias.
O Comandante Saturnino Monteiro na sua obra, Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa, recorda que:
“(...). Durante mais três horas a Nossa Senhora do Pilar, a Fortuna Guerreira, a Santa Rosa, a Nossa Senhora da Conceição e a Nossa Senhora da Assunção bateram-se galhardamente contra um adversário muito mais numeroso e igualmente determinado, provocando a admiração entre as guarnições dos navios que não estavam em ação. A dada altura, o conde de São Vicente, no desejo de se aproximar ainda mais do inimigo, começou a orçar, dando ideia de se querer bater sozinho com toda a armada turca! O conde de Rio Grande teve de lhe fazer sinal para regressar à formatura.
Durante esta fase da batalha, a mais intensa de todas, dada a menor distância que separava os dois adversários, é natural que tenham aumentado consideravelmente os danos e as baixas sofridos por ambos. A fim da tarde é muito provável que os principais navios turcos, em resultado dos dois combates que haviam travado anteriormente com os venezianos e do fogo nutrido que tinham feito durante todo o dia, já estivessem a lutar com falta de munições. O certo é que puxaram tudo para a orça e começaram a afastar-se para o mar. Aos olhos da armada cristã era como se estivessem a bater em retirada, corridos pelas quatro intrépidas naus portuguesas e pela sua companheira veneziana.”
Em meados de agosto a armada portuguesa, de regresso, passando por Messina, foi alvo de enorme interesse, com festejos, todos querendo conhecer os vencedores dos Turcos, recebendo na ocasião uma carta de agradecimento do Papa. A batalha teve, sem dúvida, um papel de relevo na política externa de D. João V, com evidente prestígio da armada portuguesa, e projeção de Portugal na Europa.
ARMADA PORTUGUESA
NAUS
Nossa Senhora da Conceição – Comandante-Chefe Almirante Furtado de Mendonça, Conde de Rio Grande (700 praças, 78 peças)
Nossa Senhora do Pilar – Almirante Conde de S. Vicente (700 praças, 82 peças)
Nossa Senhora da Assunção – Fiscal Pedro de Sousa Castelo Branco (500 praças, 64 peças)
Nossa Senhora das Necessidades – Capitão de Mar e Guerra Gillet du Bocage (500 praças, 66 peças)
Santa Rosa – Capitão de Mar e Guerra João Baptista Rolhano (500 praças, 66 peças)
FRAGATAS
S. Lourenço – Capitão de Mar e Guerra freire de Araújo (350 praças, 56 peças)
Rainha dos Anjos – Capitão de Mar e Guerra João Pereira de A 'vila (350 praças, 56 peças)
BRULOTES
Santo António de Pádua – José Jorge Matias (40 praças, 8 peças)
Santo António de Lisboa – Tomás Tolli (40 praças, 8 peças)
CHARRUAS
S. Tomás de Cantuária – Mestre Fragata António dos Santos (100 praças, 20 peças)
Tartana (?) – Mestre José Barganha (60 praças, 18 pedreiros de bronze)